Professores de Chicago <br> preparam greve

António Santos

Os professores de Chicago autorizaram o sindicato do sector a convocar uma greve contra os cortes na educação, anunciados pelos presidentes da cidade, Rahm Emanuel, e do sistema escolar, Forrest Claypool. Segunda-feira, 14, o Sindicato dos Professores de Chicago (CTU, na sigla inglesa) fez saber que 96 por cento dos docentes votaram a favor da greve num referendo em que participaram 92 por cento dos 27 mil professores da cidade.

Em causa está o projecto de Rahm Emanuel para reduzir o défice das contas públicas, avaliado em 1,1 mil milhões de dólares, recorrendo ao despedimento de cinco mil professores até Fevereiro. Outros mil foram despedidos ao longo de 2014. Rahm Emanuel, dirigente democrata, ex-chefe de gabinete de Barack Obama e antigo conselheiro dos Clinton, pretende ainda obrigar os professores a aceitar um corte salarial de 12 por cento ao longo dos próximos três anos, a par de um roubo de 653 milhões de dólares no acesso à saúde por parte dos trabalhadores da Escola Pública.

Explicando o resultado do referendo, o vice-presidente do sindicato, Jesse Sharkey, garantiu: «não equilibrem o orçamento nas nossas costas. O Sr. Rahm Emanuel não precisa de uma greve de professores... Mas se não nos der ouvidos é exactamente isso que ele vai ter».

Uma greve de professores é, com efeito, o pior pesadelo de Rahm Emanuel, sob intenso escrutínio desde que, no passado dia 24 de Novembro, um tribunal ordenou a divulgação do vídeo captado pela polícia durante uma operação que culminou com a morte de Laquan McDonald, um jovem negro de 17 anos. Corroborando a versão da polícia, que alegava legítima defesa, Rahm Emanuel ocultou o vídeo durante mais de 400 dias, período necessário, segundo o New York Times, para «garantir a reeleição do autarca». Contudo, o que as imagens agora tornadas públicas revelam é que Rahm Emanuel encobriu um homicídio: o vídeo mostra Laquan McDonald, armado com uma faca, a afastar-se de um agente que o alveja pelas costas com treze tiros. Uma vez, no chão, o jovem é cravejado à queima-roupa por mais três tiros.

Convergência

A divulgação do vídeo desencadeou uma enérgica vaga de protestos contra a brutalidade policial, o racismo e a pobreza em Chicago. Rahm Emanuel apressou-se a apresentar um pedido de desculpas, a aceitar uma investigação federal e a despedir todos os dirigentes policiais da cidade, mas as manifestações encabeçadas pelo movimento Black Lives Matter (literalmente «as vidas dos negros importam») não abrandam. No centro da indignação popular está o próprio Rahm Emanuel, cuja demissão e prisão entraram para a ordem do dia.

Mas não é só a demissão de Rahm Emanuel que une o Black Lives Matter ao Sindicato dos Professores: é o interesse dos estudantes. O sistema escolar de Chicago é o terceiro maior dos EUA, com mais de 600 escolas e 400 mil alunos, dos quais 86 por cento vivem abaixo do limiar da pobreza e 85 por cento são negros. Quando, em 2013, Rahm Emanuel encerrou 50 escolas (10 por cento de todas as escolas de Chicago), foram as comunidades negras e latinas que mais sofreram. Por outro lado, os assassinatos protagonizados pela polícia de Chicago revelam-se um autêntico sorvedouro do erário público, custando à cidade mais de 60 milhões de dólares anuais em indemnizações.

Segundo o CTU, a situação financeira das contas públicas é o produto de uma aposta de sucessivos executivos na especulação imobiliária e em magnânimas isenções fiscais para o grande capital. Para inverter este estado de coisas, os professores defendem uma maior tributação sobre as grandes fortunas. Exigem também turmas mais pequenas, um aumento salarial de três por cento e o fim das privatizações. Mas, para chegar à greve, os professores, cujo contrato colectivo caducou em Junho, têm ainda que completar uma autêntica corrida de obstáculos legais: para a paralisação ser legal, os professores do Illinois não só precisam de uma aprovação, por 75 por cento, em referendo, como têm que esperar pelos resultados de um processo de concertação social que, na melhor das hipóteses, apenas terminará em Março.

«Se for preciso, faremos greve. Em defesa dos interesses dos nossos estudantes», assegurou a presidente do CTU, Karen Lewis. «Precisamos de mais gente zangada com as condições que levam os nossos jovens a chamar “Chiraque” [amálgama de Chicago e Iraque] aos seus bairros. É preciso que as pessoas se dediquem a erradicar as condições que levaram à criação de duas Chicagos: uma, onde há arranha-céus, escolas bem financiadas, parques seguros e onde floresce o desenvolvimento económico... e uma outra, a “Chiraque” dos edifícios abandonados, das escolas fechadas, de poucos empregos e muitas balas», concluiu.




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